10 de abr. de 2012

“Retorno à Inocência, pelos olhos da compaixão”

“A inocência que advém de uma profunda experiência de vida é semelhante à de uma criança, sem ser infantil.” (1)

À medida que crescemos, nossos inocentes olhos infantis vão assistindo aos sofrimentos e dores do mundo e, quando menos esperamos, passamos a enxergar o mundo como um “lugar perigoso e ameaçador”.

E nessa experiência de vida, o nosso olhar vai se aliando ao nosso sentir, dando forma às nossas atitudes que vão se movendo de acordo com a percepção que nós mesmos criamos.

Então, crescemos. Algumas vezes, nos sentindo amedrontados, outras vezes fortalecidos; amados ou rejeitados; ofendidos ou reconhecidos; inseridos ou excluídos; pró-ativos ou reativos; acelerados ou paralisados; ora revoltados e indignados, outrora equilibrados e mais sensatos – mas, aprendendo com as dualidades a encontrar o caminho do meio - que integra e conduz a uma nova percepção: de unidade.

Mas, nessa caminhada em busca dessa compreensão que unifica, passamos por momentos de solidão quando nos confinamos em nosso próprio sofrimento. 

E, este é o momento mágico - ainda que seja doloroso - quando se estabelece a necessidade de aprendizado do princípio fundamental do diálogo: o diálogo consigo mesmo.
Pois, de fato, “ele precisa começar, acima de tudo, dentro de nós mesmos”, uma vez que o sofrimento está alocado dentro de nós, nos distanciando do entendimento e do diálogo com o mundo.

 “Se estivermos em guerra com nossos pais, nossa família, nossa sociedade... provavelmente uma guerra também estará acontecendo dentro de nós, de modo que o trabalho mais fundamental em prol da paz é retornarmos a nós mesmos e criarmos harmonia entre os elementos que existem dentro de nós – nossos sentimentos, percepções, conceitos e estados mentais.
Precisamos reconhecer e aceitar os elementos conflitantes existentes dentro de nós.
E, só quando estivermos em paz com nós mesmos, o verdadeiro diálogo com os outros e com o mundo será possível.”(2)

Então, movidos pelas ocorrências da vida, ao proporcionarmos a oportunidade desse diálogo consigo mesmo, despertamos - cada um a seu próprio tempo – nos permitindo mover para uma nova realidade!
E, ao abrimos os olhos novamente, como quem acorda de uma longa noite de sono, percebemos que tudo se faz claridade! Claridade que muitas vezes, chega a incomodar o nosso olhar, até então, tão limitado para nós mesmos! 

Então, com novos olhos, passamos a ver “além de nós mesmos” e entendemos que “cada um tem o seu próprio sofrimento. Nós não somos ‘a única pessoa que sofre’. Nossas irmãs e irmãos também sofrem. E, no momento em que formos capazes de ver o sofrimento deles, iremos parar de censurá-los e também paramos com o nosso próprio sofrimento” (Jesus e Buda – irmãos – Thich Nhat Hanh)

E, tudo isso só é possível através do contato profundo com a nossa própria experiência na vida, que nos vai capacitando a reconhecer e olhar com olhos maduros, a nossa própria dor e sofrimento, com simples aceitação – sem apegos, mas com a sensibilidade e a inocência da criança interior, que um dia chegou ao mundo com toda sua pureza para irradiar e manifestar a paz e a alegria como fruto do seu aprendizado na materialidade da forma.

Então, ganhamos novos olhos ao ativarmos a nossa “visão além do alcance da materialidade”, onde reconhecemos que a verdadeira função dos olhos não é apenas a de ver, mas também a de entender. Esses novos olhos são os ‘olhos da compaixão’ - os olhos que vêem e entendem.”

“Se existe essa compreensão, a compaixão chegará por uma via bastante natural, onde ‘os olhos da compaixão’ são olhos provindos de uma atenção profunda” que percebe a natureza da interexistência. 
E, “quando percebemos a natureza da interexistência, as barreiras entre nós e os outros se dissolvem, e a paz, o amor e o entendimento tornam-se possíveis. Onde quer que exista o entendimento, nasce a compaixão.”
  Podemos ter “diferentes raízes, tradições e maneiras de perceber as coisas”, mas ainda assim “compartilharmos as qualidades comuns do amor, do entendimento e da aceitação”.(2)

 E, é nesse momento que retornamos “à inocência da nossa criança interior”, porém, agora “sem ser infantil”, uma vez que nos apropriamos do viver verdadeiro, através da experiência concreta com a vida, onde estabelecemos um diálogo autêntico conosco, com o outro e com o mundo.

“Temos que acreditar que, ao nos envolvermos num diálogo com a outra pessoa, temos a possibilidade de realizar uma mudança dentro de nós mesmos, que podemos nos tornar mais profundos”, onde “o diálogo não é uma forma de assimilação no sentido de que um lado se expanda e incorpora o outro no seu ‘eu’”. Pois, “o diálogo precisa ser praticado com base no ‘não eu’. Temos que permitir que o que é bom, belo e significativo na tradição do outro nos transforme.” (2)

"Compaixão não é um relacionamento entre o curador e o ferido.
 É uma relação entre iguais. Somente quando conhecemos bem nossa própria escuridão
 podemos estar presentes na escuridão dos outros.
A compaixão torna-se real quando reconhecemos nossa humanidade comum."
Pema Chödrön

* Créditos da foto: Lee Ping
(1) Inocência - O Tarô Zen de Osho
(2) Vivendo Buda, Vivendo Cristo - Thich Nhat Hanh

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